Um déjà vu outra vez: varíola monkeypox é a nova emergência de saúde global
No último sábado (23/07/2022), a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou a varíola monkeypox (Monkeypox virus) como “nova emergência de saúde pública de interesse internacional”. Após reunião do Comitê de Emergência do Regulamento Sanitário Internacional, a decisão foi anunciada por Tedros Adhanom, diretor-geral da OMS, mesmo sem consenso entre os cientistas-membros. A medida foi tomada para que ocorra uma ação coordenada em escala global visando conter a disseminação do vírus.
Desde o início de maio de 2022, casos de monkeypox têm sido notificados em países onde a doença não é considerada endêmica (região da África Ocidental e Central). Segundo Adhanom, até o momento houve mais de 16 mil casos em todo o mundo, abrangendo 75 países, sendo a maior parte deles na Europa e Américas. Desses, 696 casos foram relatados no Brasil, a grande maioria no estado de São Paulo (506).
De acordo com a OMS, a transmissão do monkeypox ocorre no contato próximo com a pessoa infectada, seja através dos fluidos corporais, lesões na pele ou via respiratória. O vírus também pode ser contraído através do contato com roedores e primatas infectados. Alguns estudos recentes têm relacionado a atividade sexual como a principal forma de transmissão. Nesse caso, também estaríamos diante de uma infecção sexualmente transmissível.
Enquanto pesquisador da epidemia de HIV/aids e das biotecnologias que desta se desdobraram, tenho observado alguns aspectos que aproximam os dois cenários, como se ocorresse um déjà vu outra vez. Embora a OMS afirme que os casos de monkeypox não se limitem a homens que fazem sexo com homens, gradativamente, os principais corpos que são apresentados como “vetores” da doença por diferentes mídias, documentos e instituições (inclusive, pela agência internacional) têm sido justamente aqueles de homens que se relacionam sexualmente com outros homens. O mesmo ocorreu com a emergência da aids, no início da década de 1980.
Com a epidemia de HIV/aids (e tantas outras, seja a sífilis ou a recente covid-19), aprendemos que anexar imediatamente uma doença a um grupo específico tem múltiplos efeitos: o pânico moral e a disseminação de desinformação; a produção de um conjunto de estratégias políticas para o controle de corpos e afetos; a promoção de estigma e discriminação; o distanciamento das políticas de saúde de recortes populacionais mais plurais e assertivos. Embora o conceito de “grupo de risco” não seja mais tão frequente na saúde coletiva, a prática se mantém.
Após tantos desafios enfrentados em termos de saúde coletiva global, contamos com as ferramentas necessárias para que equívocos não se repitam e vidas sejam preservadas. Tanto a propagação da informação cientificamente embasada e crítica quanto as biotecnologias de prevenção e tratamento já nos são velhas conhecidas. Utilizá-las ou não, como sabemos, é uma escolha política.
Links para mais informações:
Informações gerais (OMS)
Estatísticas (OMS)
As diferenças entre a varíola monkeypox e a varíola humana (Instituto Butantan)
Saiba mais sobre a doença (Instituto Oswaldo Cruz)
Descrição da imagem: Em branco no fundo azul temos o logo da Organização Mundial da Saúde (OMS), em inglês World Health Organization (WHO), e a palavra “monkeypox”. Créditos da imagem: World Health Organization (WHO), via Twitter.